terça-feira, maio 21, 2024

A Lei de Deus e Suas Consequências Morais (Parte 2)



 


A Providência Divina

Segundo Kardec a Providência é a solicitude de Deus para com as criaturas.[1] Isto é, o cuidado Dele para com elas.

É ela uma conseqüência da Lei de Deus, que como dissemos tudo regula levando o Ser à redenção.

Deus está em toda parte. Como?

Para entender é preciso analisar dois aspectos da Divindade que não podem ser dissociados. São eles:

  • Transcendência
  • Imanência

Transcendente é o que transcende; transcendental. Que excele[2] em seu gênero; que excede os limites normais; superior, sublime. Que transcende a natureza física das coisas; metafísico (Houaiss). Que ultrapassa nossa capacidade de conhecer.

Imanente, é o que existe sempre em um dado objeto e inseparável dele. (Aurélio)

Que está inseparavelmente contido ou implicado na natureza de um ser, ou de um conjunto de seres, de uma experiência ou de um conceito. (Houaiss)

Deus antes de Criar[3] era o Uno-Todo, nada além Dele existia. Deste modo, deveria tudo tirar de Si. Não havia dualismo; só com a criação passa a existir distinção entre Criador e criatura.

Este Deus Criador, absoluto, inimaginável, inatingível, puramente espiritual e que está acima de tudo é Deus em seu aspecto transcendente.

Deus em seu aspecto imanente é Aquele que se encontra na criação, passou a existir a partir desta. A imanência é deste modo, a permanência do Criador na criação. É esta presença, esse impulso criador que faz com que a criação evolua sempre do estado de imperfeição ao de perfeição. É essa presença o que chamamos vida; é a Lei agindo e regulamentando todas as coisas.

Estes dois aspectos, imanência e transcendência têm de caminhar lado a lado, o panteísmo erra por esquecer o Deus transcendente, enquanto a não aceitação do Deus imanente nos conduz a um Deus distante da criação, que age de fora dela, como se isso fosse possível.

Usando de uma comparação grosseira, sem o intuito de materializar o Criador, somente no intuito de facilitar a compreensão podemos fazer a seguinte analogia:

Somos Espíritos encarnados formados pela essência espiritual e corpo; este por sua vez é formado por membros, órgãos, nervos, células etc.; quando o membro se move, ou qualquer articulação sofre um dano, o Espírito percebe; há várias sensações ao mesmo tempo no corpo, o Espírito as sente todas, diferenciando cada uma em sua manifestação particular, e até mesmo a renovação de suas minúsculas células ele comanda.

Do mesmo modo, Deus que é infinito em Suas perfeições comanda todo o universo do micro ao macrocosmo, sabendo e dirigindo tudo o que acontece, e estando presente nele em todos os momentos.

Livre Arbítrio e Destino

O entendimento das questões do livre arbítrio de do destino foi sempre um desafio para os homens de todas as eras.

Existe destino? Ou seja, os acontecimentos que sucedem em nossa vida já foram previamente estabelecidos?

Se a resposta é sim, como conciliá-la com a liberdade individual de cada um, isto é, com o livre arbítrio.

Não temos a liberdade de escolher e fazer nossa opção quanto à vida, se queremos ser isto ou aquilo? Se assim não for onde está o mérito individual?

Porém, se o livre arbítrio é um princípio do processo evolucional, e até mesmo uma lei, como pode ser que os eventos parecem já estar marcados, e que nos fatos principais de nossa vida não conseguimos interferir?

Como conjugar estas duas realidades que parecem se contradizer?

Já dissemos, há uma Lei que dirige o funcionamento de todo o universo.


Tudo o que existe é um fenômeno em movimento, dirigido por uma lei que, distinguindo-se em tantas modificações particulares, orienta os movimentos de todos os fenômenos. Esta lei constitui o código que regula o seu contínuo transformar-se.[4]


Isto é, a vontade do Deus transcendente se manifesta de forma imanente em todo o universo.

Dentro de todos estes regulamentos o Espírito é livre em sua movimentação conquistando assim o seu amadurecimento.

O Ser não é um robô dentro da mecânica universal. Não é ele passivo e sim ativo na construção de seu destino. Há o livre arbítrio, porque a liberdade é um dos atributos de Deus.


Ora, o Senhor é Espírito; e onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade.[5]


Todavia, como evitar que esta liberdade não se transforme em um caos?

É aí que entra o perfeito funcionamento da Lei definindo um novo princípio:


Causa e efeito


Desta forma ficam harmonizadas as duas variáveis desta equação, livre arbítrio e determinismo.

No primeiro passo o ser é livre, define, escolhe, semeia…

No segundo é dirigido, recebe alegria ou dor de acordo com a sua seleção. Este é o momento da colheita onde não há a participação da criatura. É a Lei conduzindo o Ser da desordem à ordem, é o mecanismo corretivo da violação.

Temos assim, caso a liberdade seja usada indevidamente:

Erro        è      Dor   è     Felicidade

Mas pode-se alegar que este mecanismo nem sempre funciona, pois há elementos que mesmo sofrendo os impactos da adversidade insistem no erro, e muitas vezes são até vencedores e felizes.

É preciso que se entenda que a liberdade é um componente sempre presente na vida do homem; mesmo estando em uma situação marcada pelo determinismo tem ele a livre escolha de como se comportar diante da situação. Isto significa que ele pode compreender o seu erro e humildemente aceitar a correção, ou aprofundar o distanciamento da lei gerando cada vez mais dor para si próprio. A vitória e a felicidade deste que dissociado de Deus se apresenta é apenas aparente, mais cedo ou mais tarde chega o momento de recolocar tudo no lugar, e por ter insistido na rebeldia mais danos ainda sofre quem se deixou levar pela indisciplina.

Vivemos em um mundo ainda dominado por forças contrárias à ordem, o "príncipe deste mundo" conforme citação do próprio Jesus ainda tem grande influência sobre as criaturas de nosso orbe, por isso é permitida essa vitória temporária do mal, porém o aprofundamento da dor que citamos anteriormente termina por levar o Ser à salvação, pois a dor acaba tendo a função de eliminar a dor, já que o instinto natural da criatura é a evolução que o leva à felicidade.

O mecanismo funciona assim: o Ser detesta a dor e busca de qualquer modo a eliminar. Todavia com o agravamento do erro o que ele faz é aumentá-la, quando ela – dor – se torna maior que a rebeldia o Ser satura de sofrer e reconhece sua pequenez diante da Lei e se rende ao bem por ser este maior.

Aí inicia um outro movimento da criatura, e de grande importância. Movimento este que trataremos mais adiante, a redenção.

Estando neste ponto podemos agora buscar compreender como se forma o destino.

O Ser é livre, porém, na mesma medida é responsável. Cada atitude nossa continua em seus efeitos, ganham eles uma trajetória e um movimento determinados pelos impulsos que o originam. Se estudarmos os vários impulsos por nós emitidos e consequentemente as várias trajetórias originadas, vamos ver aí a natureza de nossa personalidade.

Nos primeiros anos da vida o Ser tem a oportunidade de através de um novo modelo educativo aprender novos conceitos a serem por ele desenvolvidos. Importa aqui reconhecer que estas oportunidades são definidas pelo caminho escolhido e pelo que se evoluiu em existência anterior.

Na maturidade retoma o Ser o seu passado com o poder de nele lançar novos impulsos criando assim as bases de uma outra e nova existência.

Dissemos anteriormente, o primeiro passo é de liberdade, o segundo pertence ao determinismo. O destino é deste modo efeito do passado, contém momentos de absoluto determinismo, mas que são a estes sempre acrescentados lances de liberdade com o objetivo de corrigir a trajetória defeituosa.

A partir destas exposições compreendemos a grande justiça que impera no universo, e que só podemos fazer o bem ou o mal a nós mesmos, isto significa que quando a outro os fazemos, somos nós mesmos os primeiros a sermos beneficiados ou prejudicados.

Em síntese como já foi dito à humanidade em várias oportunidades: somos construtores do nosso destino.

Redenção: Correção das Causas e do Destino

A redenção é o projeto da vida para cada um de nós. Objetivo da Existência, é produto da evolução que acontece sempre, mesmo que o Ser não se aperceba e às vezes até aja de forma contrária a ela.

A Lei impulsiona o Espírito, mesmo que a reboque, sempre para frente, se não for por amor vai pela dor. No fluxo e refluxo da vida sempre há progresso.

Todavia esse processo pode ser mais natural, isto é, sem maiores sofrimentos, desde que o Ser se ajuste aos desígnios divinos.

Já vimos que as causas geram os efeitos definindo assim o destino, e que a Lei é o pensamento do Criador a conduzir tudo para a ordem. Vimos também que a Lei é amor.

Deste modo, ao invés de fazer-lhe oposição é mais conveniente buscarmos espontaneamente nos movermos na mesma direção dela, pois ela é sábia e nos dirige de forma natural e sem o constrangimento da dor.

Redenção é resgate, ou o ato ou efeito de remir, que por sua vez significa tornar a obter, a conseguir.

Dentro do aqui exposto redimir é corrigir as causas, é construir um novo destino a partir de impulsos construtivos e conscientes lançados à vida. É ocupar-se com a evolução espiritual, ser honesto, altruísta, servir ao semelhante, que é sempre instrumento de progresso.

Isso nos leva a outra conclusão: a redenção é individual, ninguém pode fazê-la pelo outro; não existe na contabilidade divina transferência de responsabilidade.

O momento de realizá-la é agora; a vida em seu finalismo é espiritual, porém o campo de ação dentro de nosso momento evolutivo atual é o mundo físico; é no ambiente terrestre o nosso campo operacional. Se no interlúdio do mundo espiritual podemos planejar, fortalecer nossos propósitos, a execução dos planos só pode se dar aqui, no mundo material. É neste ambiente dual que a luta entre bem e mal, passado e presente, ganha maiores proporções. É na liberdade de escolher que o progresso se efetiva.

Podemos classificar sempre em três as fases deste processo. Desta feita, se temos:

Erro                 è               dor             è               redenção

Também temos:

Percepção da necessidade de correção         è     experimentação è               conquista efetivada

Só através do cumprimento destas três fases seremos definitivamente realizados.


E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.[6]


Sendo que o conhecimento da verdade só se estabelece com a vivência plena dos novos valores adquiridos.

Aqui atingimos o ponto culminante de nosso estudo. De que valeria todo esse conhecimento se não o aproveitássemos em nossa edificação espiritual?

 

Ainda que eu tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, ainda que tivesse toda fé, a ponto de transportar montanhas, e não tivesse a caridade, eu nada seria.[7]


  Assim, é preciso retirar destes conhecimentos suas conseqüências morais, que é o estabelecimento de uma moral superior, a moral do Evangelho, a reger todos os fenômenos universais a partir de nós mesmos.

Com isso conquistamos a possibilidade de programar nosso futuro com base nesta moral, pois gerando impulsos renovados no mesmo sentido da Lei, que é amor, construiremos um novo destino caracterizado por segurança e felicidade.



[1] A Gênese, Cap. II item, 20

[2] Ser excelente. (Houaiss)

[3] Não é possível a nós imaginar este momento, ou seja, o princípio das coisas, o que existia antes da criação. Mas com o objetivo de fazermos a exposição dos conceitos que ora estamos defendendo faz-se necessário seguirmos este caminho.

[4] A Técnica Funcional da Lei de Deus, Cap. XII

[5] II Coríntios, 3: 17

[6] João, 8: 32

[7] I Coríntios, 13: 2


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Leia também o Post anterior:  A Lei de Deus e Suas Consequências Morais (Parte 1)

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