quinta-feira, setembro 28, 2017

Do Livro - "Paulo, Mulher e Homem em Cristo"



2 - A mulher na sociedade judaica
O Novo Testamento tanto quanto o Velho, apesar de seu caráter universal e atemporal, é literatura judaica. Por que assim dizemos? É que seus autores eram judeus1, os personagens que o compõe na maioria deles também são, e toda a história vivida se dá no âmbito da cultura judaica. Assim, é amplamente impossível abrir mão de conhecermos esta cultura2 se quisermos fazer uma análise correta destes textos, que mesmo quando escritos em grego foram na maioria das vezes vivido em hebraico ou aramaico.
Dentro deste contexto perguntamos então, qual era a posição da mulher na sociedade judaica do primeiro século da era cristã?

O lugar da mulher dentro do Judaísmo deve ser analisado à luz do contexto histórico em que se desenvolveu. Na época bíblica, as mulheres dos Patriarcas eram as Matriarcas, mulheres ouvidas, respeitadas e admiradas. Havia mulheres profetisas e juízas. As mulheres estavam presentes no Monte Sinai no momento em que Deus firmou o Seu Pacto com o povo de Israel. Participavam ativamente das celebrações religiosas e sociais, dos atos políticos. Atuavam no plano econômico. Tinham voz, tanto no campo privado como no público.3
Com o decorrer do tempo e por força das influências estrangeiras, especialmente a grega, foram excluídas de toda atividade pública e passaram a ficar relegadas ao lar. Essa situação das práticas cotidianas daquela época foi expressa nas leis judaicas então estabelecidas e permanece a mesma até hoje.4

Há no Talmud de Babilônia - Tratado "Menachot" 43 B um texto interessante, onde está escrito:

O Rabi Meir disse: O homem deve recitar três bênçãos cada dia, e elas são: Que me fizeste [do povo de] Israel; que não me fizeste mulher; que não me fizeste ignorante. (Grifos nossos)

Isto nos mostra o quanto esta era uma sociedade patriarcal.
Portanto, as mulheres eram tidas como mães procriadoras; eram não só dependentes, mas posse mesmo, primeiro do pai, e depois, quando casava, do marido. Eram consideradas incapazes de dedicar-se a temas importantes que eram exclusividade dos homens.
Assim, lembra-nos (KOCHMANN, 2007):

a presença de uma mulher num lugar público - na rua, no mercado, nos tribunais, nas casas de estudo, nos eventos públicos ou nos cultos religiosos -, era considerada uma ofensa à sua dignidade de mulher.
(…)Na prática, mulheres e escravos tinham as mesmas obrigações. A liberdade para usar o tempo conforme lhe aprouvesse era prerrogativa só dos homens. Em hebraico a palavra "marido" é baal, que significa "dono, patrão, proprietário e donos do mundo.h

Em Israel só os filhos de sexo masculino tinham direito à herança. As filhas que herdavam, quando não havia descendentes masculinos, deviam se casar no clã. Quando uma mulher ficava viúva e não tinha filhos se casava com parentes do primeiro marido.
Outras características da sociedade deste tempo em Israel:
  • Um homem não devia olhar para uma mulher casada e nem cumprimentá-la. Caso tivessem que aparecer em público elas deviam usar um véu. Ninguém podia conversar com uma mulher estrangeira.
Sob o aspecto religioso, a mulher não era igual ao homem. Estava sujeita a todas as proibições da Lei, a todo rigor da legislação civil e penal e à pena de morte. Elas não eram obrigadas a aprender a Lei. Alguns mestres julgavam que era preferível queimar a Torá que ensiná-la às mulheres.
Elas deviam se purificar quando dessem à luz. Se fosse um menino o período de purificação era de quarenta dias. Se fosse uma menina era de oitenta dias.
O pai podia vender uma filha. A esposa não recebia nenhuma herança do marido, dedicava-se às ocupações domésticas, preparando a alimentação do marido. Devia lavar as mãos, o rosto e os pés do marido e tinha grande crédito com ele se lhe desse muitos descendentes do sexo masculino.
Poderíamos fazer muitas outras citações, porém pensamos que só estas já nos dão subsídio para compreender a posição da mulher na sociedade judaica no tempo do apóstolo Paulo.
Dito isto agora podemos ler um texto contido na Epístola aos Efésios e ver se ele está de acordo com os costumes da época:

Vós, mulheres, sujeitai-vos a vosso marido, como ao Senhor; porque o marido é o cabeça da mulher, como também Cristo é o cabeça da igreja, sendo ele próprio o salvador do corpo.
De sorte que, assim como a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres sejam em tudo sujeitas a seu marido.
Vós, maridos, amai vossa mulher, como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela, para a santificar, purificando-a com a lavagem da água, pela palavra, para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa e irrepreensível.
Assim devem os maridos amar a sua própria mulher como a seu próprio corpo. Quem ama a sua mulher ama-se a si mesmo.
Porque nunca ninguém aborreceu a sua própria carne; antes, a alimenta e sustenta, como também o Senhor à igreja; porque somos membros do seu corpo.
Por isso, deixará o homem seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher; e serão dois numa carne.
Grande é este mistério; digo-o, porém, a respeito de Cristo e da igreja.
Assim também vós, cada um em particular ame a sua própria mulher como a si mesmo, e a mulher reverencie o marido.5

Sem ainda aprofundarmos na análise podemos com segurança afirmar que Paulo não era machista, aliás, na época não existia machismo, esta era a cultura e ponto final. Paulo era um revolucionário, isto sim, era muito avançado para a época, pois pregava com toda clareza:

Vós, maridos, amai vossa mulher, como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela…
Assim devem os maridos amar a sua própria mulher como a seu próprio corpo.
Assim também vós, cada um em particular ame a sua própria mulher como a si mesmo.

Qual ser humano comum que pensava deste modo naquela época? Qual o judeu que se preocupava em manifestar amor e carinho por sua mulher?
E mesmo no polêmico texto da 1ª Carta a Timóteo:

A mulher aprenda em silêncio, com toda a sujeição. 6

Já notamos um avanço, pois conforme vimos anteriormente alguns mestres julgavam que era preferível queimar a Torá que ensiná-la às mulheres, e aqui Paulo mostra–nos que elas podiam aprender, isto é, estudar a Lei. Mais adiante trataremos melhor este assunto quando falarmos da admiração que tinha de Abigail, e de seu ideal de mulher.

( O Restante desta Obra você encontra disponível em: Paulo, Mulher e Homem em Cristo e Outros Estudos do Evangelho )


1 Mesmo Lucas, que não era um autêntico filho de Israel, sofria uma grande influência hebraica.
2 Cf. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, 50ª ed., questão 627, Rio de Janeiro: FEB, 1980.
3 KOCHMANN, Sandra (Rabina). O Lugar da Mulher no Judaísmo,.retirado de http://www.pucsp.br/reverhttp://www.pucsp.br/reverhttp://www.pucsp.br/rever , acessado em 15/11/2007
4 Ibidem.
5 Efésios, 5: 22 a 33
6 Timóteo, 2: 11

Nenhum comentário: