O Espiritismo como
ciência que estuda o plano físico e o homem, o plano espiritual e
os Espíritos que o compõem, e as relações entre os dois, pôde
com autoridade nos informar a respeito das atividades do nobre
Espírito Maria no Plano Espiritual.
Sabemos que quanto mais
o Espírito é evoluído, mais ele trabalha no Plano Maior da Vida.
Espíritos ainda materializados que somos, após o desencarne
necessitamos de um período de adaptação à nova vida, isto é
comum a todos, e esta adaptação, segundo nos informam os próprios
Espíritos, tem o tempo maior ou menor de acordo com a condição
evolutiva moral e espiritual de cada um.
Na condição mediana
em que nos encontramos, mostra-nos a literatura espírita a
necessidade de que o Espírito alterne momentos de trabalho com
momentos de descanso, pois tendo em seu corpo espiritual, ainda,
elementos materiais, mesmo que em outra dimensão, necessita de
refazimento e recomposição energética. Todavia há Espíritos que,
de tão grande sua evolução, jamais descansam, trabalham
ininterruptamente.
Pelo que podemos
depreender através de nossas reflexões este é o caso de Maria de
Nazaré, aquela escolhida pelo Pai para ser a mãe do Espírito mais
nobre que nosso orbe já conheceu.
No livro Boa Nova,
no citado capítulo que narra sobre o seu desencarne temos que o
primeiro desejo da Mãe de Nosso Senhor após deixar o corpo físico
foi rever a Galileia com os seus sítios preferidos1.
Bastou desejar e lá estava ela revendo o Lago de Genesaré e
toda sua bela paisagem.
Neste instante lembrou
dos discípulos que eram já a este tempo perseguidos pela fúria
humana ainda dissociada do Bem, e desejou abraçá-los
fortalecendo-os em suas lutas íntimas. É que já acontecia por
parte das autoridades do império romano as perseguições aos
seguidores de Jesus, perseguições estas que levavam os cristãos
autênticos a grandes sacrifícios em favor do Evangelho. Bastou esta
expressão de sua vontade e rapidamente se viu em Roma onde nos
cárceres do Esquilino centenas de seguidores de Seu Filho sofriam
terríveis constrangimentos.
Narra Humberto de
Campos que imediatamente os condenados experimentaram no coração
um consolo desconhecido.
E continuando a
narrativa informa-nos o cronista do Mundo Invisível:
Maria se aproximou de um a
um, participou de suas angústias e orou com as suas preces, cheias
de sofrimento e confiança. Sentiu-se mãe daquela assembleia de
torturados pela injustiça do mundo. Espalhou a claridade
misericordiosa de seu Espírito entre aquelas fisionomias pálidas e
tristes.
Eram anciães que confiavam
no Cristo, mulheres que por ele haviam desprezado o conforto do lar,
jovens que depunham no Evangelho do Reino toda a sua esperança.
Maria aliviou-lhes o coração e, antes de partir, sinceramente
desejou deixar-lhes nos espíritos abatidos uma lembrança perene.
Que possuía para lhes dar? Deveria suplicar a Deus para eles a
liberdade?! Mas, Jesus ensinara que com ele todo jugo é suave e todo
fardo seria leve, parecendo-lhe melhor a escravidão com Deus do que
a falsa liberdade nos desvãos do mundo. Recordou que seu filho
deixara a força da oração como um poder incontrastável entre os
discípulos amados. Então, rogou ao Céu que lhe desse a
possibilidade de deixar entre os cristãos oprimidos a força da
alegria. Foi quando, aproximando-se de uma jovem encarcerada, de
rosto descarnado e macilento, lhe disse ao ouvido:
— “Canta, minha filha!
Tenhamos bom ânimo!… Convertamos as nossas dores da Terra em
alegrias para o Céu!…”
A triste prisioneira nunca
saberia compreender o porquê da emotividade que lhe fez vibrar
subitamente o coração. De olhos extáticos, contemplando o
firmamento luminoso, através das grades poderosas, ignorando a razão
de sua alegria, cantou um hino de profundo e enternecido amor a
Jesus, em que traduzia sua gratidão pelas dores que lhe eram
enviadas, transformando todas as suas amarguras em consoladoras rimas
de júbilo e esperança. Daí a instantes, seu canto melodioso era
acompanhado pelas centenas de vozes dos que choravam no cárcere,
aguardando o glorioso testemunho.
Acrescenta ainda o
autor espiritual que:
Logo, a caravana majestosa
conduziu ao Reino do Mestre a bendita entre as mulheres e, desde esse
dia, nos tormentos mais duros, os discípulos de Jesus têm cantado
na Terra, exprimindo o seu bom ânimo e a sua alegria, guardando a
suave herança de nossa Mãe Santíssima.2
Notamos
assim, que desde o primeiro momento no Plano Espiritual Maria, já
consciente, trabalha e intercede pelos sofredores buscando aliviá-los
de suas dores e angústias, sejam elas de natureza física ou
espiritual.
Há belíssimo poema de
Maria Dolores que conta-nos com todo lirismo o socorro de Maria ao
Espírito Judas Iscariotes em momentos que este sofria grave crise de
consciência.
Citamo-lo a seguir:
RETRATO DE MÃE
Depois
de muito tempo,
Sobre
os quadros sombrios do Calvário,
Judas,
cego no Além, errava solitário…
Era
triste a paisagem,
O
céu era nevoento…
Cansado
de remorso e sofrimento,
Sentara-se
a chorar…
Nisso,
nobre mulher de Planos superiores,
Nimbada
de celestes esplendores,
Que
ele não conseguia divisar,
Chega
e afaga a cabeça do infeliz.
Em
seguida, num tom de carinho profundo,
Quase
que, em oração, ela lhe diz:
— Meu
filho, por que choras?
Acaso,
não sabeis? — replica o interpelado,
Claramente
agressivo,
Sou
um morto e estou vivo.
Matei-me
e novamente estou de pé,
Sem
consolo, sem lar, sem amor e sem fé…
Não
ouvistes falar em Judas, o traidor?
Sou
eu que aniquilei a vida do Senhor…
A
princípio, julguei
Poder
faze-lo rei,
Mas
apenas lhe impus
Sacrifício,
martírio, sangue e cruz.
E
em flagelo e aflição
Eis
a que a minha vida agora se reduz…
Afastai-vos
de mim,
Deixai-me
padecer neste inferno sem fim…
Nada
me pergunteis, retirai-vos senhora,
Nada
sabeis da mágoa que me agita,
Nunca
penetrareis minha dor infinita…
O
assunto que lastimo é unicamente meu…
No
entanto, a dama calma respondeu:
— Meu
filho, sei que sofres, sei que lutas,
Sei
a dor que te causa o remorso que escutas,
Venho
apenas falar-te
Que
Deus é sempre amor em toda parte..
E
acrescentou serena:
— A
Bondade do Céu jamais condena;
Venho
por mãe a ti, buscando um filho amado.
Sofre
com paciência a dor e a prova;
Terás,
em breve, uma existência nova…
Não
te sintas sozinho ou desprezado.
Judas
interrompeu-a e bradou, rude e pasmo:
— Mãe?
Não me venhais aqui com mentira e sarcasmo.
Depois
de me enforcar num galho de figueira,
Para
acordar na dor,
Sem
mais poder fugir à vida verdadeira,
Fui
procurar consolo e força de viver
Ao
pé da pobre mãe que me forjara o ser!…
Ela
me viu chorando e escutou meus lamentos,
Mas
teve medo de meus sofrimentos.
Expulsou-me
a esconjuros,
Chamou-me
monstro, por sinal,
Disse
que eu era
Unicamente
o Espírito do mal;
Intimou-me
a terrível retrocesso,
Mandando
que apressasse o meu regresso
Para
a zona infernal, de onde, por certo, eu vinha…
Ah!
detesto lembrar a horrível mãe que eu tinha…
Não
me faleis de mães, não me faleis de amor,
Sou
apenas um monstro sofredor…
— Inda
assim — disse a dama docemente —
Por
mais que me recuses, não me altero;
Amo-te,
filho meu, amo-te e quero
Ver-te,
de novo, a vida
Maravilhosamente
revestida
De
paz e luz, de fé e elevação…
Virás
comigo à Terra,
Perderás,
pouco a pouco, o ânimo violento,
Terás
o coração
Nas
águas de bendito esquecimento.
Numa
nova existência de esperança,
Levar-te-ei
comigo
A
remansoso abrigo,
Dar-te-ei
outra mãe! Pensa e descansa!…
E
Judas, nesse instante,
Como
quem olvidasse a própria dor gigante
Ou
como quem se desagarra
De
pesadelo atroz,
Perguntou:
— quem sois vós?
Que
me falais assim, sabendo-me traidor?
Sois
divina mulher, irradiando amor
Ou
anjo celestial de quem pressinto a luz?!…
No
entanto, ela a fitá-lo, frente a frente,
Respondeu
simplesmente:
—Meu
filho, eu sou Maria, sou a mãe de Jesus.3
2
Idem, ibidem.
3
Momentos de Ouro, cap. 3
Um comentário:
Que maravilha ler esse poema! Que maravilha de página! Que os céus os guardem!
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