quinta-feira, outubro 18, 2007



Reencarnação

Singelos apontamentos sobre a teoria das vidas múltiplas.

A reencarnação é uma é uma crença antiga da humanidade, não foi o espiritismo nem os espíritas que a inventaram, desde todos os tempos o homem tem a intuição de sua realidade.

Entre os orientais, o Bhagavad Gita, o Tao te King, o Livro Tibetano dos Mortos já a divulgavam; na Grécia temos em Platão, em Pitágoras, entre outros, a mesma idéia palingenésica. A mesma crença já existia entre os egípcios, e mesmo entre os descendentes do povo hebreu ao tempo do Antigo Testamento haviam aqueles que defendiam a idéia da pluralidade das existências.

O que acontece é que todas essas crenças viam a idéia do retorno do espírito ao mundo físico de uma forma incompreensível, muito vaga. Só com o advento do espiritismo o tema foi estudado com clareza, com lógica e com rigor científico, ficando assim, o espiritismo, entre nós os ocidentais, marcado como o maior divulgador da idéia reencarnacionista.

Podemos dizer com muita segurança que não podemos penetrar nas questões máximas e últimas da vida se não tivermos a reencarnação como certeza absoluta, e mesmo a idéia de Deus se torna reduzida se não adotarmos a pluralidade das existências como lei universal.

Podem dizer que estamos radicalizando, porém não estamos, e pretendemos com lógica e bom senso discorrer nestas linhas sobre o tema de tal forma que não fique dúvida sobre o assunto.

Como ponto inicial podemos dizer que quanto à existência da alma1 há basicamente duas hipóteses a respeito: a sua existência e a não existência.

Os que defendem a não existência da alma, ou os que acreditam que tudo acaba quando termina esta vida física são os materialistas, e a estes não nos dirigiremos neste momento, não nos ocuparemos desta hipótese por não ser objetivo deste texto convencer a ninguém da idéia espiritualista.

Os que aceitam a existência da alma e a sua sobrevivência após a morte são os espiritualistas e é a estes que dirigimos nossas palavras sem nenhuma pretensão de fazer proselitismo ou de convencer quem quer que seja sobre nossas idéias filosóficas. O que queremos é avaliar entre as possíveis idéias sobre vida futura, qual a mais lógica e a que prima pelo maior bom senso.

Tendo por base a sobrevivência da alma após o fenômeno que denominamos morte, podemos dizer que só existem duas hipóteses a serem avaliadas, são elas a da unicidade da existência, e a da pluralidade das vidas, o que se dá com a hipótese da reencarnação.

Os que defendem a primeira possibilidade afirmam que Deus cria as almas no momento da fecundação, que elas têm uma vida na Terra a partir do nascimento e que depois da morte seguem, de acordo com o que tiverem feito, para um tormento eterno ou para o gozo eterno.

Temos já neste momento duas objeções que devem ser meditadas e que segundo pensamos torna mesmo impossível a idéia da unicidade da existência.

A primeira diz respeito ao pouco caso que os defensores desta idéia fazem de Deus. Deus segundo qualquer religião que nele crê é Onipotente, Onipresente, Todo Sábio, e detentor de todas as perfeições; se for ele imprevidente ou imperfeito em qualquer área que seja, já não é mais Deus. Se Deus criasse a alma no exato momento da fecundação perderia Ele um de seus atributos deixando assim de ser Onipotente, pois para criar uma alma ficaria na dependência do casal humano que o ajudaria, ou seja, se em cima da hora surgisse qualquer problema ao casal e este não mantivesse sua relação, haveria um ato falho e Deus teria que adiar aquela criação por simples falta de prevenção. Neste caso, os homens teriam tanta importância na criação de uma alma quanto o próprio Deus, pois este ficaria sempre na dependência daqueles.

É isso lógico? Seria isso possível? Cremos que não, mas fica aqui a idéia para que se pensem a respeito.

A outra objeção a esta idéia esta centrada na lei de causa e efeito. Diz a nossa ciência, que a todo efeito deve existir uma causa anterior. Diz o bom senso que causa e efeito devem ter uma relação que os ligue. Assim, uma causa inteligente gera um efeito inteligente, uma causa finita um efeito finito e assim por diante.

Ora uma existência física por maior que seja tem um tempo determinado, ou seja um dia acaba. É impossível, deste modo, que uma causa finita (vida física) gere um efeito infinito (eternidade). Não pode um curto espaço de tempo determinar uma conseqüência interminável, seja ela boa ou má.

Cremos que só estes argumentos já provam a impossibilidade da unicidade da existência por falta de argumentação lógica, porém, ainda vamos analisar outras situações.

Uma outra questão a ser analisada é a das aptidões inatas.

De acordo com a teoria da unicidade da existência a alma é criada no momento da fecundação, como já dissemos. Aí surge uma grande dúvida, se são criadas por Deus desta forma, por que tanta diversidade entre as mesmas? Por que têm os espíritos de muitas crianças aptidões tão diversas mesmo tendo recebido a mesma educação e procedendo de mesmos pais? Algumas têm grande tendência para a arte, se revelando às vezes grandes gênios, outras para a ciência, outras para os serviços manuais etc.. Existem crianças que desde pequenas revelam serem portadoras de grande maldade, enquanto outras são extremamente bondosas, tudo isso a despeito da educação que receberam ou das virtudes ou defeitos de seus pais.

Aqui não fica dúvida, estas almas são bem diferentes. E se assim são, de acordo com a teoria da criação da alma por ocasião do seu nascimento, é por que Deus as criou diferentes. Não seria um grande erro do Criador, até mesmo uma grande injustiça dar a uns maiores possibilidades que a outros? E aí, depois, ainda exigir que todos tenham que ser virtuosos do mesmo modo para que possam alcançar uma eternidade gloriosa? Será que aquele que tem tendências para os vícios não terá mais dificuldades do que aquele que desde pequenininho mostra-se ser uma alma virtuosa?

Diante da possibilidade de uma existência única estas são questões insolúveis, porém se trabalharmos os mesmos problemas sob a ótica das existências múltiplas tudo fica mais fácil e lógico.

Os Espíritos que mostram sabedoria desde novos, são aqueles que já trabalharam estes conhecimentos em vidas anteriores; o portador de virtudes é que já depurou-se e realizou reforma moral anteriormente, enquanto que o que tem tendência para aos vícios ainda precisa se dispor e realizar a mesma transformação.

Do mesmo modo que há homens maduros e outros imaturos, há entre os espíritos os que têm mais amadurecimento espiritual e os que são mais atrasados em seu processo evolutivo, há também almas infantis e almas amadurecidas.

Tudo isso fica muito claro se analisarmos os fatos à luz da teoria reencarnacionista.

Como dissemos anteriormente não temos a intenção de convencer ninguém, mas apenas de analisar a questão de forma lógica. Não estamos usando argumentos religiosos de uma forma específica, nem a opinião de guias ligados a nenhuma crença particular, partimos apenas do princípio da existência de Deus, da alma e de sua imortalidade, temas esses comuns a todas as religiões.

Muitos outros aspectos poderiam ser ainda por nós analisados, porém para encerrar este breve texto vamos refletir apenas sobre mais um tema para não nos tornarmos enfadonhos no discorrer sobre este assunto. Trata-se da questão levemente abordada anteriormente da justiça de Deus e suas conseqüências.

Como já abordamos Deus para ser Deus tem que ser ilimitado em todas as suas perfeições, se em apenas um item ele assim não for, existe a possibilidade de um outro ser, ser mais do que ele, e aí, este é que seria Deus.

Portanto, do ponto de vista da justiça, Deus é o Justo por excelência, ou dizendo melhor, Deus é a própria Justiça em seu grau máximo.

Deste modo respondamos algumas questões sob a ótica da unicidade, e depois, da pluralidade das existências.

Se nossa conduta numa única vida é que definirá nossa sorte futura, se tormento ou graça eterna, como deverá ser avaliado aquele que tem maiores facilidades em relação ao que tem só dificuldades em sua vida? Nosso mundo é um mundo de contradições, assim temos aqueles que têm plena saúde, outros que passam toda sua vida lutando com várias espécies de doenças, às vezes preso no leito durante toda sua encarnação. Uns têm grande poder econômico, outros são totalmente desprovidos de recursos. Existem ainda aqueles que não têm a mínima oportunidade de estudar e adquirir conhecimentos, outros freqüentam as melhores escolas conseguindo os maiores destaques.

Podemos ainda nos perguntar sobre as crianças que desencarnam na mais tenra idade sem ter a oportunidade de se mostrarem nem boas nem más. Teriam elas o céu sem nenhum esforço de progresso moral, ou estariam destinadas ao inferno sem maiores merecimentos?

Muitos outros exemplos poderiam ser aqui acrescentados mas julgamos desnecessário. O certo é que qualquer ser humano que tenha um pouco de bom senso percebe que de acordo com a proposta de uma vida única, tudo isto soa como grande injustiça. Sendo Deus a Soberana Justiça, estaria tudo isso de acordo com os Seus propósitos superiores? Cremos que não. E se Deus não está errado, a nossa interpretação da vida é que está. Coloquemos a lei das existências múltiplas na análise e tudo fica de acordo com a justiça Daquele que é todo Poder. Qualquer situação de carência atual, denota um anterior mau uso de determinado recurso; as possibilidades que temos são oportunidades de fixação de uma virtude através da boa utilização das mesmas. Essa é a Lei. Lei que está em pleno acordo com a moral, Lei que mostra a grandeza do Criador e nos descortina toda sua Sabedoria.

Dito tudo isso lançamos agora uma outra questão. Por que tudo isso é necessário? Por que tem o espírito após uma dura existência de voltar novamente a habitar uma veste física reiniciando sempre?

Allan Kardec pergunta aos espíritos a respeito e eles nos informam que não conseguindo o espírito atingir a perfeição em uma só existência ele reencarna tantas outras vezes quantas forem necessárias para atingir este objetivo.

Todavia, poderíamos insistir na pergunta, por que é necessário este modelo, não poderíamos evoluir no plano espiritual sem necessitar a volta ao corpo físico? Os espíritos respondem a Kardec que não, é necessário que haja novamente a encarnação, ou seja, a volta à vida física. Foi Pietro Ubaldi quem de forma mais lógica, explicou-nos este porquê, isto é, porque o modelo se dá deste modo.

Segundo este filósofo italiano, a criação original de Deus é puramente espiritual2. Tudo o que conhecemos como criação, ou seja, os mundos físicos, o espaço, o tempo, a forma de um modo geral, surgiu devido ao que ele chamou de “queda”, que aconteceu devido a insubordinação de um grupo inumerável de espíritos. A partir daí o espírito se aprisionou na matéria, tendo que realizar a volta ao estado de original, o que se dá pela evolução.

Esse é um tema polêmico e que não pretendemos discutir nestas poucas linhas, ele está muito bem desenvolvido na obra de Ubaldi, que devido à sua complexidade gastou aproximadamente dez mil páginas no desenvolvimento do tema, portanto, quem quiser elogiar ou criticar tal filosofia, que estude estas páginas. Aqui só pretendemos usar sua teoria para explicar o porquê da necessidade reencarnatória que é o tema deste artigo.

Esta “queda” se deu em dimensões altíssimas em que não temos a condição, com os recursos atuais que possuímos, de compreendê-la totalmente, porém, é fato, que o Sistema, que é a criação original, engloba o anti-sistema que foi o universo criado a partir da queda.

Vivemos segundo Ubaldi num universo que funciona por modelos únicos, em que a repetição do motivo fundamental da criação se dá ao infinito. Assim a queda original se repete em manifestações menores em nossa vida, onde podemos afirmar, inclusive, que isto passa a fazer parte de nosso processo evolutivo. Neste modelo segundo explica Ubaldi,

a evolução não pode dar-se de forma ascendente contínua e retilínea, mas unicamente de acordo com o primeiro momento da queda, isto é, por um caminho interrompido por contínuos retornos ou descidas na matéria, a fim de nela completar um novo trecho de subida, conseqüência das etapas precedentes.3

Assim, a união do espírito com a matéria através do processo de encarnação, e a repetição deste fato, nada mais é do que a repetição do motivo original da criação da forma. Reencarnar-se é entrar novamente num processo de “queda”. No plano espiritual o espírito goza de liberdade, goza de maiores recursos, de uma memória mais ampla; quando encarna-se perde grande parte destes recursos devido a união com a matéria.

Diz Ubaldi,

Esta perda de consciência, no ato da descida na forma material, é um eco do primeiro motivo da queda, que volta e se repete a cada reencarnação4.

A cada existência a consciência desperta cada vez mais reconquistando os valores perdidos, na realidade quando Jesus no “Sermão do Monte” nos disse: resplandeça a vossa luz5, em verdade ele nos dizia da luz que possuímos em estado latente, que se apagou quando da queda. Essa conquista se dá com a evolução, onde a reencarnação é um instrumento essencial, como dissemos alhures, uma Lei Universal que se dá em toda natureza em nosso universo material.

1 Tomaremos neste artigo a palavra alma como sinônimo de espírito, ou seja, como individualidade extra física que sobrevive ao trespasse físico.

2 Esta afirmativa está em pleno acordo com a informação dos Espíritos a Kardec na questão 85 de “O Livro dos Espíritos”, quando nos informam as entidades superiores que o mundo espiritual preexiste e sobrevive a tudo.

3 Problemas Atuais, pág. 257

4 Idem, pág. 263

5 Mateus, 5: 16

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