quinta-feira, março 03, 2022

Carta aos Hebreus - Diabo, o Dominador da Morte?


Uma vez que os filhos têm em comum carne e sangue, por isso também ele participou da mesma condição, a fim de destruir pela morte o dominador da morte, isto é, o diabo… (hebreus, 2: 14)

Através deste versículo o autor aprofunda o tema da encarnação do Messias e de seu objetivo.

Uma vez que os filhos têm em comum carne e sangue; o versículo refere-se à nossa necessidade – humanidade – de estarmos vinculados ao processo da encarnação através de um corpo físico.

Os filhos somos todos nós. Nós, temos em comum, esta necessidade, a de estarmos vinculados a um corpo de carne e sangue buscando a nossa evolução que será a recomposição de nosso destino objetivando a Vida em Deus.

Trata-se da alegoria da "queda do Espírito". Por termos nos distanciado de Deus através da infração de Sua Lei, criamos para nós a necessidade de estarmos associado à matéria – laço que prende o Espírito1 – num processo de morte e renascimento até que nos desobriguemos deste ciclo pela Perfeição Espiritual.

Assim, planejamos no Mundo dos Espíritos, e vimos para a realidade física realizar o projeto; esta é forma de evoluirmos e conquistarmos o direito da Vida Abundante.

Como não conseguimos realizar todo processo de aperfeiçoamento numa só experiência física, renascemos várias vezes com este objetivo nos tornando cada vez melhores e mais próximos do ideal.

Quando, após alguns milênios, a humanidade sob Sua responsabilidade adquiriu certo estado de amadurecimento, Jesus veio até nós para dar o recado final, o do amor, sem o qual seria impossível progredirmos para Deus.

Sendo uma das características básicas do amor a adequação, não tinha como Jesus nos iniciar neste sentimento superior, senão adequando-o às nossas possibilidades, e por ser o exemplo instrumento essencial de educação, conforme já dissemos, e devido a importância da lição, Ele mesmo para se fazer compreendido encarnou; por isso também ele participou da mesma condição, ou seja, ele tornou-se humano, fez-se homem:

E o Verbo se fez carne e habitou entre nós.2

Neste passo é preciso compreender que Jesus jamais perdeu, com a encarnação, Sua superioridade de Espírito, todavia ele tomou um corpo de carne e sangue semelhante ao nosso. Esta era a ideia daqueles que o conheceram pessoalmente:

Nisto conhecereis o Espírito de Deus: todo espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus3

A lição é de grande valia para nós que estamos matriculados na escola do aperfeiçoamento consciente. Se quisermos aprender, ensinar e exemplificar o amor é preciso participarmos da experiência daquele a quem amamos. Não há como ensinar o Sentimento Sublime, Alimento das Almas, simplesmente no quadro-negro de uma escola, é preciso descermos às experiências de nossos semelhantes, na mesma condição deles, e operar exemplificando o que desejamos ver por eles assimilado. Este foi o processo educacional trazido Jesus e que deve ser também o nosso

É mais uma vez o Evangelho se completando dentro da realidade que já expusemos, não existe Evangelho sem comprometimento com a vivência de seus ensinamentos por parte daquele que o prega.

a fim de destruir pela morte o dominador da morte; é à morte de Jesus que o autor se refere, apesar de que a morte aqui não representa só a morte da cruz, não obstante ser ela importantíssima, essencial mesmo, por se tratar do coroamento do processo.

Todo processo encarnatório do Cristo desde a preparação para a Manjedoura até o Gólgota representa esta morte, a descida de um Espírito Puro até a matéria.

A necessidade encarnatória se dá pela transgressão do Espírito. É uma bênção de Deus, diga-se de passagem, mas só há necessidade dela devido a sermos ainda impuros; em outras palavras poderíamos dizer que estamos "mortos".

Esta morte só será destruída pela vida, vida que há em Cristo e que Ele veio nos trazer, vida do amor vivenciado.

Em nosso mundo ainda involuído não há como sabermos da saúde, senão pela doença, não há como percebermos a luz senão através das trevas. Do mesmo modo, a vida se contrapõe à morte e só através desta pode ser vista como tal.

Para destruir a morte do afastamento de Deus, Jesus teve de encarnar, isto é, morrer como Puro Espírito, lembremos da parábola:

Na verdade, na verdade vos digo que, se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto.4

Assim, através da morte, de sua encarnação, pôde ensinar o meio de eliminarmos de nossa história a morte do afastamento de Deus pela transgressão de Sua Lei.

Isto é o que quer dizer a fim de destruir pela morte o dominador da morte, isto é, o diabo.

Vejamos, a morte é o afastamento de Deus. Nós nos afastamos Dele através da desobediência (pecado original) transgredindo Sua Lei. Não é esta a lição da parábola de Adão e Eva?

Deste modo, quem é o dominador da morte? O diabo?

O dominador da morte, o gerador dela, é o nosso sentimento desequilibrado, sentimento este que pode se manifestar através da rebeldia, do inconformismo, da presunção, da cobiça, e de inúmeras outras formas, mas que na essência é o mesmo.

Enquanto estivermos presos a estes sentimentos inferiores podemos dizer que estamos mortos, afastados de Deus, necessitados do ciclo encarnatório, pois só pela morte da encarnação evoluiremos, o que quer dizer espiritualização, nos reeducando, assim, em moral, para a Perfeição Divina.

Mas e o diabo, quem é ele e o que tem ele a ver com isso?

Em primeiro lugar precisamos compreender que a Bíblia é um conjunto de livros altamente simbólicos. Existe verdade histórica na Bíblia? Sim, muita. Entretanto, temos história e alegoria nos desafiando a todo instante, e a fim de ampliarmos a nossa compreensão é preciso diferenciá-las.

O diabo é um exemplo destas alegorias que permeiam todo o texto. Não estamos com isto reduzindo sua importância no contexto, mas buscando dar-lhe o melhor entendimento tirando da letra que mata o espírito que vivifica.

Diabo vem do grego diabolos e significa aquele que desune (inspirando inveja, ódio, orgulho); caluniador maledicente. É derivado do verbo "diaballo" (separar, desunir, atacar, acusar, caluniar, enganar)…5

Deste modo, todo aquele que realiza o que este verbo exprime pode ser considerado um diabo.

No contexto bíblico ele é aplicado àqueles que se opõem à causa de Deus, assim, do mesmo modo que podemos dizer que o egoísmo e o orgulho são os nossos maiores inimigos, pois são os sentimentos que mais atrasam a nossa evolução, é certo também afirmarmos que diabo é todo sentimento que se opõe à realização de Deus, do Cristo, do Evangelho, em nossas vidas. Como dissemos, são estes sentimentos inversos à proposta de Deus que nos levam à transgressão da Lei e à morte como consequência.

Se não dermos lugar em nossos corações a estes sentimentos, jamais Inteligência alguma conseguirá nos tirar do caminho reto do Bem.

Portanto, compreender o diabo como um ser criado por Deus e que está fadado eternamente ao mal e que deseja por isso corromper toda a criação levando-a para o inferno eterno, é um grande erro de interpretação.

Não estamos com isto dizendo que não possam algumas Inteligências voltadas provisoriamente ao mal, por certo período, encarnarem a personalidade opositora ao Bem e tornarem verdadeiros "diabos". Isto existe, é real como nos mostra a literatura espírita, e mais comum do que podemos supor. A codificação Kardequiana, tanto quanto as obras subsidiárias do Espiritismo tratam muito bem este assunto, mas daí dar a estas almas transviadas um valor eterno que elas não têm vai uma distância muito grande.

Portanto, como dissemos, é preciso nos acautelarmos contra o diabo dos nossos sentimento inferiores e contrários ao Evangelho, eles é que são os dominadores da morte, sem eles, Espírito nenhum, mesmo que amplamente maldoso pode nos fazer mal algum.



1 (KARDEC, O Livro dos Espíritos. 50ª ed. 1980), Q. 22 item a)

2 João, 1: 14

3 I João, 4: 2

4 João, 12: 24

5 DIAS, Haroldo Dutra (tradutor). O Novo Testamento. Brasília: Conselho Espírita Internacional, 2010





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"...amai-vos, este o primeiro ensinamento; instruí-vos, este o segundo." (O Espírito de Verdade, ESE Cap. VI)

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